Em importante
plenária, in off, pelo msn, entre o mais alto
representante do reinado e um representante do povo, sobre questões triviais,
bastante triviais...
O RATO ROEU A ROUPA DO REI DE
ROMA
Sindicalista diz:
Roeu porque a roupa não estava bem guardada. Em uma boa
administração, estaria no lugar certo e o rei ainda a teria inteira.
Ministro-chefe diz:
Não há porque se esquentar, depois o rei dá chumbinho ao rato... E
aí, como estás?
Sindicalista diz:
Mas a fiscalização vai pegar? Tem que pegar... Eu estou bem.
Sindicalista diz:
Chumbinho é proibido em nosso país e um rei não pode ser o
primeiro a dar o mau exemplo.
Ministro-chefe diz:
Rei é rei.
Ministro-chefe diz:
Os demais são simples súditos.
Sindicalista diz:
Não é bem assim, não.
Sindicalista diz:
Um rei tem que fazer a vontade do povo, que é o verdadeiro soberano...
Ministro-chefe diz:
Ora, companheiro, e o povo quer ratos???
Ministro-chefe diz:
Nosso rei, que é um homem do povo, fez certo então...
Ministro-chefe diz:
Mesmo que por meios não tão populares,
Ministro-chefe diz:
Como dizia o velho e bom filósofo: os fins justificam os meios.
Sindicalista diz:
Meu caro Ministro, o senhor sabe bem que o povo desandará a
comprar chumbinho no mercado informal. Como o governo poderá reclamar? Isto,
sem falar nos que não vão obedecer a nenhuma regra, nem lei, seguindo o exemplo
do rei, que não as respeita.
Ministro-chefe diz:
Companheiro, companheiro... Ele aumenta o imposto do chumbinho, para
inibir o seu consumo; aplica multas por rato morto com este tipo de produto; e, em
contrapartida, incentiva a criação de gatos em substituição ao veneno...
Sindicalista diz:
Se ele é contra o chumbinho... E vocês demonstram isso em seus
discursos. Vai utilizá-lo porque, então?
Ministro-chefe diz:
Se vingar do rato danado!
Sindicalista diz:
Como? Ele pode usar, mas o resto da população não?
Ministro-chefe diz:
Podem, sim. Só não vão querer.
Ministro-chefe diz:
O imposto estará elevado.
Ministro-chefe diz:
Gato baratinho,
baratinho... E não é perigoso.
Sindicalista diz:
Sim, sim, mas este reinado não pensa no desequilíbrio ambiental
que tanto gato pode causar no ecossistema?
Ministro-chefe diz:
CHURRASQUINHO DE GATO!
Ministro-chefe diz:
Uma delícia!
Sindicalista diz:
Ótimo esse governante! Agora quer mudar o hábito alimentar de
toda a população porque o rato roeu a roupa dele. Isto, devido ao triste fato
de não ter guardado direito a sua roupa.
Ministro-chefe diz:
O problema de vocês é não observar o conjunto, sabia?! O gesto do
rei movimentou a economia de seu reino.
Ministro-chefe diz:
Comprou chumbinho, gerando demanda e, logo, renda.
Ministro-chefe diz:
Criou condições e aumentou os impostos deste produto...
Ministro-chefe diz:
Em seguida, vendeu gatos...
Ministro-chefe diz:
Consumiu carne felina...
Ministro-chefe diz:
etc e tal.
Ministro-chefe diz:
Observe os números. Tornou-se um país mais rico.
Sindicalista diz:
Carne felina acaso é saudável? Em longo prazo essa carne pode
trazer sérios prejuízos à saúde de toda a população.
Ministro-chefe diz:
Isto só se tiver o gostinho dos ratos que eles comerem.
Ministro-chefe diz:
Ainda mais, gato tem sete vidas... Você como sete vezes.
Sindicalista diz:
Justamente, SETE VEZES MAIS CHANCES DE PASSAR MAL!
Ministro-chefe diz:
Ora, então coma o rato!
Sindicalista diz:
E, como eu posso ter certeza de quê o rato não comeu chumbinho?
Ministro-chefe diz:
Sinceramente, se você morrer, é que o rato comeu...
Sindicalista diz:
E quem se importa comigo, não é? Ou com o restante da população
desfavorecida? O importante é matar o desgraçado do rato que roeu a roupa do imprudente
rei.
Ministro-chefe diz:
Acho que você aprendeu...
Ministro-chefe diz:
(Risos)
Sindicalista diz:
O pior de tudo é que quem tem boca não vai mais querer ir a Roma, sabendo
que estão morrendo por ela.
Ministro-chefe diz:
Coma os gatos!
Sindicalista diz:
Que comeram os ratos...
Sindicalista diz:
É a mesma coisa!
Sindicalista diz:
O chumbinho pode ser bioacumulado na cadeia alimentar.
Ministro-chefe diz:
Lá vem! Eu só trato de economia...
Ministro-chefe diz:
O meu princípio estava certo, meu caro...
Ministro-chefe diz:
Chama-se multiplicador keynesiano.
Ministro-chefe diz:
Gastos do governo aumentam a renda.
Ministro-chefe diz:
Mas, sempre vem vocês com esse discurso ecológico, querendo frear
o nosso desenvolvimento.
Ministro-chefe diz:
Isso de bioacumulado é o quê? Jogo da mega sena?
Ministro-chefe diz:
Falávamos de saúde, companheiro.
Sindicalista diz:
Não, na verdade falávamos da falta dela.
Ministro-chefe diz:
Hum, talvez na falta de saúde pessoal... Mas, muita saúde em nossa
emergente economia.
Ministro-chefe diz:
Algumas pessoas podem tranquilamente morrer, se as demais puderem enriquecer
um pouco.
Sindicalista diz:
A que ponto chega este nosso sistema; dinheiro é sinônimo de
saúde. Esse capitalismo “doentio”, operante em nosso país, que num simples roer
de rato, move-se toda a economia e arrasa todo o ecossistema, para matar alguns
e enriquecer uma minoria burguesa.
Ministro-chefe diz:
Não está gostando? Imagine se fosse com a roupa da rainha que o rato
bulisse!
Ministro-chefe diz:
Vou dormir!!!!
Ministro-chefe diz:
Tchau, primo!
Ministro-chefe diz:
Vamos esperar uma revolução!
Ministro-chefe diz:
Abraço para o povo!
Sindicalista diz:
Para o povo daí também.
Sindicalista diz:
Boa noite!